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04/01/2018 / Em: Clipping

 


Uma educação sem destino, um país à deriva (Hora Extra – Coluna – 03/01/2018)

 

Escrevo este texto ainda sob a égide da virada do ano e de todos os bordões, polêmicas, memes etc gerados por ela. Nada muito fora do esperado: é meu trigésimo-nono réveillon…pouco das eternas pautas de fim de ano podem realmente surpreender. Mas a parte legal do início de um novo ciclo de vida/tempo é podermos colocar tudo em perspectiva e realinhar projetos, objetivos. Deixar para trás o que antes considerávamos importante e que agora não tem mais relevância alguma. Sim, também isso é meio clichê, sem dúvida. Mas é algo que pode nos tirar de sérios problemas. Passei alguns dias de dezembro analisando a situação das Universidades brasileiras em alguns rankings nacionais e internacionais. Sempre aquela velha história: no que presta, estamos entre os últimos, no que não presta, entre os primeiros. Lógico, a razão de ser de resultados tão ruins não pode ser unívoca. Há diversos fatores incidindo sobre as estruturas de formação no ensino superior – público, em especial – para que a situação seja esta que todos nós, bem ou mal, conhecemos. Mas há nisso tudo algo que me faz pensar que as velhas metas de ano novo são emblemáticas para uma virada de página naquela realidade. Vejam: qual o propósito da Universidade pública brasileira? Que tipo de homem/mulher queremos formar ali? Qual o telos (finalidade) do ensino superior no país? Não conheço NINGUÉM capaz de responder a tais perguntas com a clareza necessária. Gostaria muito de ser desmentido, mas temo que a dura realidade dos fatos deponha a meu favor: NUNCA tivemos um projeto claro de Universidade no Brasil. Aliás, nunca tivemos um projeto claro de ESCOLA no país! São, sempre, na melhor das hipóteses, arremedos de propostas governamentais, de uma dada administração, de um dado grupo de ideólogos…nunca um compromisso de nação. Mas isso não graças a políticos ou gestores que não querer outra coisa a não ser manutenção de poder, de status quo. A culpa é nossa, que gostamos de mentiras agradáveis. Não há povo de alta qualidade governado por gestores de baixa qualidade. Gestores e governantes são apenas a projeção daqueles que representam. Simples assim. Ora, nós gostamos de falastrões! “Construímos ‘trocentas’ Universidades no país!”, “abrimos sei lá quantas vagas de ensino superior”, “foram abertos uma enormidade de cursos no período de tal a tal”…ótimo, e daí? Sei de empreiteiras que ficaram bem felizes com tais iniciativas, mas ainda não vi resultado REAL de tais, permitam-me as aspas, “investimentos”. Gostaria de lembrá-los: cada aluno de Universidade pública no Brasil custa, em média R$ 41.000,00/ano…muito mais do que qualquer aluno de faculdade privada (que, também na média, sai com a mesma formação dos seus colegas pagos pelos impostos). Falamos, então, de alto investimento público em indivíduos que devem (deveriam, pelo menos) oferecer contrapartida à sociedade que os mantem em situação de evidente privilégio. É isso o que acontece? Tenho sérias dúvidas… Aliás, se levarmos em consideração que apenas 15% da população brasileira chega ao ensino superior e que apenas 20% dos universitários são considerados “alfabetizados de fato”, isso deve colocar ainda mais lenha na fogueira da equação “investimento x retorno”. Devemos dizer a nós mesmos, antes de qualquer coisa, que tipo de povo queremos ser. Só assim, com isso em mente, com esta meta cristalizada, podemos avançar com alguma segurança. De outra forma, estamos condenados eternamente a sermos o país do “jeitinho”, no qual os incêndios são apagados diariamente, num barco sem destino, sem norte, sem rumo determinado. Para quem não tem para onde ir, qualquer lugar serve. E este descaso com o nosso destino nos trouxe até aqui. Não é culpa de ninguém mais…é toda nossa.