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05/02/2014 / Em: Clipping

 


Administração, o curso que todo mundo quer fazer   (Folha Online – Educação/Blog da Sabine – 04/02/14)

Um em cada seis universitários no país está matriculado em um curso de administração. Em 2012, foram quase 325.000 ingressantes em administração no país. Isso excluindo os cursos tecnólogos. Estou falando só dos bacharelados. Até a Unicamp, famosa por resistir a cursos “tecnicistas” como direito e jornalismo, abriu um curso de administração no campus de Limeira com 240 vagas  (leia aqui). O país carece –e muito– de médicos, de engenheiros e até de geólogos. Nessas carreiras, os salários iniciais são bem competitivos. Mas os alunos querem cursar administração.



O negócio da educação   (Carta Capital – Carta na Escola – Ed. 83 – Fevereiro 2014)

Um bilhão de reais foi o preço desembolsado pelo grupo norte-americano Laureate na compra de uma das instituições de Ensino Superior mais cobiçadas do mercado, a paulistana FMU, em agosto de 2013. A Laureate já investiu cerca de 2 bilhões de reais no mercado nacional de educação e esse negócio, um dos maiores já feitos no Brasil na área, só perde para a compra da Unopar pela Kroton, por R$ 1,3 bilhão, em 2011. Outra jogada pode aquecer ainda mais o setor em breve: a fusão entre a Kroton e a gigante Anhanguera. A ação ainda está em análise no Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), órgão que regula a concorrência no Brasil. No último parecer, o Cade concluiu que a aquisição implicaria riscos de concentração nos mercados de ensino presencial e a distância. Até a conclusão desta edição, a situação permanecia indefinida. Majoritários no Brasil desde os anos 1970, faculdades e centros universitários privados concentram hoje 5,1 milhões dos 7 milhões de matrículas no Ensino Superior. A maior parte dessas 2,1 mil instituições privadas (76%) acessa recursos públicos através de projetos como o Programa Universidade para Todos (ProUni) e o Fundo de Financiamento Estudantil (Fies). Por que o setor tornou-se tão atraente e por que há tantas fusões e aquisições desde o fim do século XX? Para especialistas, a resposta está em um decreto de 1997 que permitiu finalidade lucrativa para entidades educacionais particulares – o texto foi revogado em 2001 e em 2006, mas a liberação subsistiu. O texto, que marca a segunda onda de expansão da educação superior privada no Brasil, “fomentou e legitimou a mercantilização”, afirma Helena Sampaio, professora da Faculdade de Educação da Unicamp e pesquisadora do Núcleo de Pesquisa de Políticas Públicas da USP. Como a Constituição de 1988 garantiu autonomia às universidades, as faculdades passaram a cobiçar esse status, vislumbrando a possibilidade de manejar com mais liberdade a criação e a extinção de cursos e o número de vagas oferecidas. Com isso, instituições menores começaram a se fundir em novas e maiores entidades. “O processo inicial de fusão e aquisição no setor começa fora da Bolsa de Valores, dentro do próprio mercado”, explica a economista Cristina Helena Almeida de Carvalho, professora da Faculdade de Educação da UnB. A organização e a consolidação prévia do setor privado no Ensino Superior brasileiro ajudaram a pavimentar a chegada de grandes grupos educacionais ao País a partir do ano 2000. A existência de marcas já reconhecidas pelo mercado local e o patrimônio acumulado pelas instituições nacionais ao longo dos anos, inclusive o imobiliário, também atraíram os gigantes internacionais.  “Tudo no Brasil contribuiu para a chegada dos grandes grupos, sobretudo a existência de um forte setor privado nacional”, diz Helena. “A demanda reprimida por vagas no Ensino Superior, também agravada pelo aumento de matrículas no Ensino Médio e pela crescente necessidade de qualificação exigida pelo mercado em razão do implemento econômico recente, contribuiu para a expansão”, afirma Henrique Heidtmann Neto, chefe do Centro de Graduação da Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas (Ebape) da FGV, no Rio de Janeiro. “No Brasil, ao contrário de outros países, temos a tradição de o aluno do Ensino Médio ter a preferência pelo ensino universitário em vez do técnico”, explica. Em 2007, quatro grupos abriram capital na Bolsa de Valores de São Paulo. Essa captação possibilitou a entrada de diversos acionistas no negócio da educação superior, inclusive do capital estrangeiro. “Quem compra instituições lucrativas são fundos de investimento de grupos fechados compostos de investidores nacionais e internacionais com participação em empresas de capital aberto ou fechado”, diz a economista Cristina. Para ela, um dos desdobramentos disso é o “envolvimento posterior na gestão da empresa educacional”. Uma das maiores consequências desse movimento é o surgimento de um novo modelo de empresa educacional, na qual a gestão é geralmente subordinada aos interesses financeiros. “Os acionistas se envolvem e participam das decisões administrativas das empresas de ensino, que funcionam com base em governança corporativa”, explica Cristina. Como outros especialistas, ela credita a isso à proliferação de medidas como enxugamento de estruturas empresariais, demissões de docentes, queda do valor da hora-aula paga ao professor e expansão da modalidade de educação a distância. “Isso atinge não só a relação com os docentes, mas também a qualidade do ensino, já que a precarização se reflete no conteúdo”, ela afirma. “Como a lógica é a da empresa lucrativa, a cultura pedagógica perde muito”, avalia Maria Lucia dos Santos, 53, professora de Ensino Superior há 14 anos. Ela também diagnostica uma influência da filosofia corporativa sobre o trabalho pedagógico. “A competição e o medo da demissão tornam os docentes mais temerosos com o pensamento crítico em sala de aula, pasteurizando os ensinamentos”, opina Maria. Ela integra o grupo de trabalho Docência e Qualidade, nascido de uma greve deflagrada após professores de uma entidade privada paulistana protestarem, em 2012, por falta de pagamento de salários.  Presidente do Grupo Anhanguera Educacional, um dos maiores do setor, com 428 mil alunos, 70 campi e 500 polos de ensino, Roberto Valério rebate as críticas sobre perda de qualidade. “Nossa abertura de capital está totalmente alinhada à missão da instituição de contribuir com a democratização do acesso ao Ensino Superior e de realizar uma série de investimentos em qualidade acadêmica, com a captação de recursos no mercado”, afirmou. Ele ressalta que o grupo mantém convênios com universidades internacionais e registrou desempenho positivo e superior à média do mercado na última avaliação do MEC. Além disso, Valério destaca que as instituições privadas concentram 75% das matrículas nessa etapa: “Tivemos papel relevante em proporcionar o acesso a um público que não conseguiria fazer faculdade de outra forma”. Hoje, 40% dos alunos de graduação da Anhanguera recebem bolsas ou financiamento via governo federal.