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31/07/2013 / Em: Clipping

 


Depois de sucesso nos EUA, cursos de universidades de ponta chegam ao Brasil   (O Estado de S.Paulo – Educação – 30/07/13)

A Universidade de Stanford foi a primeira instituição a apostar no Mooc (Massive Open Online Course, em inglês), em 2011. O curso Inteligência Artificial atraiu 160 mil pessoas ao redor do mundo. Hoje, uma das principais plataformas de Moocs, o Coursera, reúne 62 instituições, como Stanford e Columbia, e tem 4 milhões de usuários. O segredo? Os Moocs são cursos livres – qualquer pessoa pode fazê-los, independentemente do nível de instrução –, não têm seleção, são a distância e gratuitos. Basta se inscrever e cursar. Agora, os Moocs chegam com força ao Brasil. Já estão em duas das principais instituições do País, a Universidade de São Paulo (USP) e a Universidade de Brasília (UnB), e neste semestre devem ser oferecidos por outras seis: Universidade Estadual Paulista (Unesp), Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), Fundação Getúlio Vargas (FGV), Pontifícias Universidades Católicas de São Paulo (PUC-SP) e Rio de Janeiro (PUC-Rio) e Universidade Federal de Campina Grande. A Unesp, por exemplo, deve oferecer certificados e tutoria para seus cursos online, que hoje estão disponíveis na plataforma Unesp Aberta, transformando-os em Moocs. Atualmente, há um projeto-piloto para funcionários da instituição. Nem todas as instituições oferecem certificados e muitas cobram por eles. A universidade está elaborando também parcerias com instituições estrangeiras, principalmente dos EUA e da Dinamarca, para promover uma “mobilidade virtual” em disciplinas de graduação a partir de 2014. “Na Unesp, os Moocs dessas universidades valeriam como disciplina optativa”, afirma Klaus Schlünzen Junior, coordenador do Núcleo de Educação a Distância da Unesp (NEaD). A PUC-SP também criou um projeto-piloto: um grupo coordenado pelo professor João Mattar desenvolveu o Mooc de língua portuguesa com a plataforma Redu. Já há mais de 5 mil inscritos. “Estamos também investigando as experiências internacionais. O que vimos é que há uma taxa de evasão muito grande. O nosso desafio é pensar em estratégias para fazer com que mais pessoas cheguem ao fim desses cursos”, diz Angelita Quevedo, coordenadora de Educação a Distância da PUC-SP.  Em Harvard, por exemplo, que tem a plataforma edX com o Massachusetts Institute of Technology (MIT), só 0,9% dos inscritos em Introdução à Ciência da Computação conseguiram concluí-lo (1.388 dos 150.349 matriculados), disse o professor do Mooc, David Malan, em texto publicado na universidade. Em comparação, 703 dos 706 inscritos na forma presencial da mesma disciplina conseguiram terminá-la.



Hélio Schwartsman
Abismo na educação   (Folha de S.Paulo – Opinião – 31/07/13)

Os resultados do Índice de Desenvolvimento Humano dos municípios brasileiros (IDHM) mostram que o país melhorou bastante ao longo das últimas duas décadas. Numa das mensurações mais eloquentes, 85,8% das cidades registravam um índice classificado como “muito baixo” em 1991, proporção esta que passou a 0,6% em 2010.  Dadas as boas notícias, passemos a analisar os desafios. O IDHM é composto por três dimensões: renda, longevidade e educação, e todas elas evoluíram positivamente nestes 20 anos. O que chama a atenção, entretanto, é que a educação, mesmo sendo a área que mais avançou, é também a que puxa a nota global dos municípios para baixo. O desempenho do país nesse campo ficou na faixa do desenvolvimento “médio”, enquanto a renda e a longevidade receberam respectivamente as qualificações “alta” e “muito alta”.  Este é, se quisermos, o retrato do dilema em que o Brasil se encontra. A maioria dos municípios deixou para trás o cenário de terra arrasada, no qual nada funciona, e já apresenta alguma estrutura capaz de propiciar ensino e saúde à população. Para avançar a partir daqui, porém, precisaremos cada vez mais de educação e o problema é que, apesar das melhorias, ela ainda é péssima. Vale observar que o IDHM utiliza apenas indicadores que aferem os anos de estudo, sem levar em conta a qualidade do ensino ministrado –que é, de longe, a nossa principal falha.  Os sinais desse fosso educacional, que faz com que menos da metade dos jovens concluam o ensino médio, já são visíveis por todos os lados. Empresas têm dificuldades em preencher vagas para trabalhadores mais qualificados. Faltam médicos e engenheiros. Contingentes expressivos dos bacharéis em direito não conseguem passar na prova da OAB. O pior de tudo é que não há muito o que se possa fazer para mudar esse panorama num horizonte relativamente curto de tempo.

A medida da mentira   (Folha de S.Paulo – Opinião – 31/07/13)

Denominada talvez ironicamente de programa Mais Médicos, a medida provisória nº 621 traz riscos à saúde da população e piora a qualidade dos cursos de medicina. A medida burla a legislação vigente ao não garantir os direitos trabalhistas aos médicos contratados. Enviará profissionais a regiões distantes ou para a periferia de centros urbanos sem oferecer mínima condição de exercício da medicina. Hoje, faltam locais para atendimento que garantam o mínimo de dignidade humana aos pacientes. Não existem unidades de emergência ou hospitalares. Carecemos de recursos básicos para diagnóstico, como exames laboratoriais ou radiológicos, e até de medicamentos essenciais para o tratamento das doenças mais comuns. Caso os médicos brasileiros não se disponham a se aventurar nessas condições, serão trazidos profissionais formados fora do país, sem passar por exame para comprovar sua qualificação. Considerando que, nos últimos exames de revalidação de diplomas, o índice de reprovação esteve em torno de 90%, é provável que nove em cada dez médicos “importados” não tenham capacitação para atender adequadamente os cidadãos. Estaremos, nesse caso, expondo a população, justamente a mais vulnerável social e economicamente, à assistência por profissionais com formação insuficiente. A proposta ainda preconiza a abertura de grande número de escolas médicas ou a ampliação do número de vagas nas já existentes. É público que não existem docentes em número suficiente para tanto, pois nunca houve a preocupação de formá-los. Além disso, não há hospitais com vocação universitária para dar conta de tal demanda. Nessas condições, sofreremos piora gradativa da qualidade de formação do médico, trazendo mais prejuízos para população. Como agravante, a medida provisória nº 621 chega à beira da irresponsabilidade. Modifica o curso de medicina de seis para oito anos, sendo que, nos dois anos adicionais, o aluno iria “trabalhar” nas regiões nas quais não existem médicos atendendo pacientes. A supervisão de sua faculdade seria feita à distância. Ou seja, essa população, voltamos a frisar, justamente a mais vulnerável, seria exposta a uma espécie de roleta russa da saúde. As escolas de medicina mais tradicionais em nosso país já se manifestaram contrárias à medida. Ela causa enormes transtornos à organização da grade curricular sem agregar novos conhecimentos. O argumento de que os alunos teriam contato com a realidade do SUS é descabido, uma vez que, na quase totalidade dos cursos, o aprendizado já é feito com pacientes ligados aos serviços públicos. O Sistema Único de Saúde é uma das maiores conquistas sociais do povo brasileiro e a medida provisória nº 621 ameaça desconstruí-lo. A garantia de acesso à assistência médica de qualidade a todos, de maneira universal e integral, sempre foi preocupação primeira dos médicos. Infelizmente, a meta nunca foi alcançada, primeiramente pela falta de financiamento adequado e estável, em especial por parte do governo federal. O gerenciamento ineficaz gera desperdício do já minguado dinheiro destinado à saúde pública. No ano passado, por exemplo, o Ministério da Saúde deixou de executar cerca de R$ 17 bilhões disponíveis em seu orçamento. Diante de tal quadro, afirmar que o problema principal do SUS é a simples falta de médicos é demagogia, um reducionismo de quem parece não ter capacidade de encontrar soluções para os reais problemas do setor. Pior, é trabalhar para jogar a opinião pública contra os médicos, que são tão castigados por esse sistema quanto os outros profissionais de saúde e a própria população, essa sim a maior vítima.

FLORISVAL MEINÃO, 67, é presidente da Associação Paulista de Medicina
RENATO AZEVEDO, 58, é presidente do Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo

A educação no país do futebol   (Folha de S.Paulo – Opinião – 31/07/13)

O país do futebol ouviu milhares de cidadãos clamando nas ruas por uma “educação padrão Fifa”.  Um primeiro olhar aos dados educacionais dos últimos dez anos nos permite comemorar o acesso ao ensino fundamental de 98% das crianças e adolescentes de 7 a 14 anos.  Sem dúvida, os dados mostram um enorme salto para uma educação de acesso quase universal.  No entanto, um olhar mais atento revela que ainda estamos longe de oferecer uma educação de qualidade. O esforço e o investimento do governo federal com o programa de alfabetização na idade certa é um indicador disso. Ou seja, ainda não resolvemos questões básicas para que nossa população esteja preparada para exercer sua cidadania.  De um lado, temos um maior acesso à educação, não só ao ensino fundamental, como também aos ensinos médio e superior. A maioria dos jovens que ingressaram na faculdade nos últimos anos consiste na primeira geração da família a estudar um curso superior. Além disso, pesquisas comprovam que quanto maior o grau de instrução, maior o nível salarial.  Por outro lado, as novas gerações querem protagonizar suas vidas, buscam mais autoria, diálogo e participação direta nos rumos da sociedade. Os jovens demandam novas estratégias de democracia direta.  Escutar o clamor das ruas por melhores condições de educação significa descortinar os vários entraves educacionais no Brasil, de modo que se possa superar o desafio de atender demandas de curto prazo, sem perder o contexto histórico e estrutural do país. Nesse sentido, destaco dois aspectos que ainda entravam a melhoria da educação no Brasil. Primeiro, as excludentes desigualdades educacionais: regionais (Norte/Nordeste de um lado e Sul/Sudeste de outro), entre a educação no campo e nas cidades e ainda as enormes diferenças entre as escolas situadas em regiões centrais e as da periferia das grandes cidades.  Segundo, a defasagem entre o currículo escolar e o mundo vivido cotidianamente pelas crianças, adolescentes e jovens.  O mundo contemporâneo exige uma educação que incorpore não apenas as novas tecnologias, mas também os temas da cidadania e que afetam o planeta. Sustentabilidade, equidade social, participação política, mobilidade urbana, empreendedorismo. Além de novos valores como cooperação, respeito, diálogo e cultura de paz.  As metodologias de ensino e aprendizagem precisam privilegiar o aprender fazendo, os games e as simulações. E, principalmente, demandam nova organização da escola aberta à comunidade e ao mundo.  Mudanças estruturais como essas dependem de se priorizar a educação como política pública nacional de fato e não somente nos discursos dos governantes.  A retórica dos políticos não convence mais os jovens que, assim como seus pais, sabem que é necessária uma educação de qualidade para alcançarem uma vida digna e bem-estar. Uma das conquistas dos milhares de jovens que foram às ruas é a instauração do debate político e social em torno da educação. As novas gerações estão colocando a questão como pauta na agenda política, econômica e social.

MARIA ALICE SETUBAL, doutora em psicologia da educação pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, é presidente dos Conselhos do Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária (Cenpec) e da Fundação Tide Setubal