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27/03/2018 / Em: Clipping

 

 

Proposta quer 40% do ensino médio a distância (Destak – Carreira e Formação – 27/03/2018)

Mudanças podem impactar a formação profissional; ministro da educação quer vetar a proposta do CNE

 

É com preocupação que a sociedade e entidades ligadas à educação vêm acompanhado a proposta do Conselho Nacional de Educação (CNE) do Governo Federal de liberar 40% das aulas do ensino médio para serem feitas a distância. A resolução de atualização das Diretrizes Nacionais Curriculares do Ensino Médio, divulgada pelo CNE e que traz a proposta, prevê ainda que no caso de Educação de Jovens e Adultos (EJA), este percentual se aplique a 100% das aulas. A proposta prevê que a carga horária a distância seja cumprida com a participação dos alunos em trabalhos voluntários e contribuições para a comunidade, além de cursos, estágios, oficinas, trabalho supervisionado, pesquisa de campo, aprendizagem profissional, iniciação científica e atividades pedagógicas, abrangendo cinco horas diárias e podendo ser realizada em parceria com instituições previamente credenciadas pelas instituições de ensino.

Reforma

A abertura a atividades remotas no ensino médio já havia sido permitida pela reforma dessa modalidade, aprovada pelo governo Michel Temer em fevereiro de 2017. O que as novas Diretrizes trazem é uma regulamentação de carga horária. As diretrizes ainda estão em debate e a aprovação é esperada para este semestre. No entanto, decisões importantes aprovadas pelo CNE – órgão de assessoramento do MEC – precisam ser homologadas pelo ministério. A reforma do ensino médio também definiu a flexibilização do currículo e parte da grade pode ser cursada a partir da escolha dos alunos entre cinco áreas: matemática, linguagens, ciências da natureza, ciências humanas e ensino profissionalizante. Essa parte flexível deve responder a 40% da carga horária total. O texto das Diretrizes prevê que atividades a distância, com apoio de tecnologia digital, incidam sobre qualquer conteúdo ou disciplina.

Polêmica

Pais, especialistas e profissionais de educação no entanto, temem a precarização e terceirização do ensino na rede pública, que concentra 88% das matrículas do ensino médio. Christiane Lázaro Gomes, administradora de empresas, mãe de duas adolescentes, discorda da mudança. “Eu deixei de trabalhar quando minha filha mais nova completou 13 anos para acompanhá-la nos estudos. Ela tinha dificuldades para estudar sozinha e largava tudo pra brincar com a turma do prédio onde moramos. Imagine se ela ficasse dois dias em casa e eu não pudesse largar o trabalho?”. Para Christiane, é preciso levar em consideração que a maioria da população do país não tem condições de acompanhar os filhos em casa em uma fase tão difícil como é a adolescência. “Ao invés de aumentarem a carga horária pra melhorar a qualidade do ensino, querem diminuir?”, questiona. O coro dos descontentes é engrossado por Maria Izabel Azevedo Noronha, presidente da Apeoesp, Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo. “Esta proposta representa um retrocesso profundo. Uma máquina [computador] nunca substituirá um professor. A interação professor e aluno é fundamental e uma troca recíproca de aprendizado, além da questão que envolve a socialização do adolescente”, ressalta. Ainda segundo ela, uma mudança assim requer um debate profundo, o que não ocorreu na aprovação da reforma do ensino. “Já temos a reforma que foi uma enrolação, e agora isso? Os meios digitais são úteis como ferramentas de apoio, mas os alunos, especialmente os adolescentes, ainda precisam de um acompanhamento presencial, de disciplina e compromisso”, conclui Maria Izabel. Dentro do Governo, no entanto, a medida também enfrenta resistências como, por exemplo, do próprio Ministro da Educação e Cultura, Mendonça Filho, que anunciou a intenção de vetar a proposta. No próprio Conselho Nacional de Educação a proposta não é consenso. Alguns dos seus integrantes já se manifestaram publicamente contrários ao projeto.

O Destak tentou ouvir a versão do CNE, mas não obteve resposta até o fechamento desta edição.

Números

O Brasil tem hoje 6,9 milhões de alunos matriculados no ensino médio público. Deste total, em torno de 1,5 milhão de jovens na faixa de 15 a 17 anos (14,6% do total) já abandonaram os estudos. O Censo Escolar do MEC registrou queda no número de alunos matriculados no ensino médio nos últimos anos. Veja gráfico nesta página. Outro agravante para a implantação da medida está na infraestrutura educacional do país, onde cerca de 60% das escolas do ensino médio não têm laboratório de ciências, 16% não têm laboratórios de informática e 34% não dispõem sequer de bibliotecas.